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DIA 1 – TEM DIVERSÃO, MAS NÃO TEM PALHAÇADA.

Cheguei um pouco mais cedo e imediatamente senti um frio na barriga. Os atletas foram chegando aos poucos, ninguém chegou atrasado e todos pareciam ter o mesmo comportamento. Eles chegam, se cumprimentam, colocam os equipamentos e começam a se alongar. O Lucas Catta Preta chegou e em menos de dois minutos já estava no tatame fazendo o seu alongamento.

Confesso que nesses minutos que antecederam o início do treino eu fiquei um pouco desconfortável. O que eu estou fazendo aqui? O meu maior receio era atrapalhar o treino dos atletas e desperdiçar a oportunidade que o Daniel me oferecera.

 

O Daniel chegou e em instantes eu já estava no tatame fazendo o aquecimento com os atletas. O treino começou com uma corrida, movimentos de braços e outros movimentos de deslocamento que não sei os nomes. O meu foco nesse momento era reproduzir da melhor forma possível o que os atletas faziam com maestria. O Daniel pediu para que um lutador da equipe – Marcone – entrasse comigo no octógono para fazer alguns dos exercícios de rolamento e deslocamento. Quando entrei no octógono, o Marcone estava com os punhos em riste e por um instante bateu um sentimento de medo. Essa sensação durou um segundo, parecia que eu estava entrando para lutar com ele naquela jaula que é o octógono. Ele estava apenas me esperando para começar a fazer os exercícios. Em instantes o suor já escorria pelo o meu corpo e a respiração já estava mais intensa. Isso era só o aquecimento, o treino nem havia começado.

Depois fizeram um jogo cujo o objetivo era encostar no joelho do outro, é claro que o outro tinha o objetivo de esquivar para impedir que a pessoa que estava no meio da roda fosse capaz de tocar em seu joelho. Uma espécie de bobinho do MMA, quem não conseguisse encostar no joelho de ninguém em dez segundos tinha que pagar dez flexões. Eu era uma presa fácil e nesse momento os atletas me trataram como café com leite. Uns ameaçavam vir em minha direção, mas quando viam que era eu já mudavam o foco para procurar outra presa. Quem conduziu esse jogo foi o Luís, treinador cubano de wrestling da equipe. Em um determinado momento ele apontou pra mim e disse: “Vai!” Corri atrás dos joelhos dos lutadores, mas nenhum joelho foi tocado. Paguei as minhas dez flexões.

Além desse, outros jogos desse tipo também aconteceram em meio ao clima de descontração e diversão. Tem diversão, mas não tem palhaçada. Os atletas se divertem, mas a sensação é que o jogo descontraído é só parte de um treino extremamente sério e com propósitos bem claros.

Em um desses jogos, o objetivo era encostar no ombro ou no joelho do lutador que está fazendo dupla contigo. Eu estava com o Marcone, o mesmo cara que me fez tremer na base ao entrar no octógono, nesse jogo você também poderia dar queda no lutador que está treinando contigo. É claro que eu tentei pegá-lo desprevenido para dar uma queda. Eu sabia que ele não esperava por isso, mas não tive sucesso. O cara estava super atento e imediatamente frustrou a minha tentativa.

 

Na segunda parte do treino, o Daniel e Vicente mostravam a técnica de um movimento e cada um tinha que reproduzi-lo em dupla. Foram várias técnicas e algumas pausas para beber água. Eu fiquei muito atento aos movimentos, mas não tinha condições de reproduzi-los. Nesse momento eu prestava muita atenção, mas enquanto eles reproduziam os movimentos em duplas eu chutava o saco de pancadas. Já vou falar sobre isso.

Antes preciso pontuar uma coisa que achei muito interessante. Os atletas prestam muita atenção aos movimentos, são respeitosos entre si, com os treinadores e são extremamente focados. Nessa parte do treino tem menos descontração, é um momento de foco e repetição. A sensação que tive é que cada um tem um propósito muito claro na cabeça e vale lembrar que eles estão ali para isso. Não é a toa que são atletas profissionais. É nítido o desejo de evoluir e isso vem de dentro pra fora.

Enquanto os atletas estavam treinando os movimentos, eu estava numa batalha com o saco de pancadas. O Daniel colocou o celular com um cronômetro no chão e o meu objetivo era chutar o saco por um minuto, depois tinha trinta segundos de descanso, trocava de base e voltava a chutar o saco. Foi assim durante todo o treino. Parava apenas para analisar o próximo movimento que os lutadores iriam fazer e voltava para o saco. É uma experiência incrível, só tinha eu o saco, nada mais. As vezes o saco parecia sumir e ficava apenas eu comigo mesmo. Aos poucos fui achando a minha respiração e aprendendo a dosar força e ritmo. Tá achando que foi fácil? Nem pensar, depois o Daniel me orientou a dar dois chutes em sequência e depois foram três chutes em sequência. Fiquei exausto e com os pés doendo de tantos chutes, foram muitos chutes. Na última pausa para beber água eu não conseguia bebê-la de tão ofegante que estava. Precisei acalmar a respiração para conseguir beber a água. Vale ressaltar que as pausas são extremamente curtas e ninguém as usa para dar o migué. A pausa é apenas para se hidratar e só.

Ao final, os atletas treinaram em duplas, nesse momento eu fiquei apenas observando. Os atletas são uma inspiração de vida. Respeito, foco, disciplina e muita gana. Risada só depois do treino, nesse momento o importante é o foco no aperfeiçoamento de si. Cada um com a sua dupla, com o máximo respeito e aproveitando cada instante de estarem ali. É um privilégio poder ver isso de perto.

O treino terminou com todos os atletas no tatame tocando as mãos e fazendo um grito de guerra uníssono. Eles são claramente uma família.

 

Como se não bastasse, após o treino, tive uma conversa com o Daniel que durou mais de uma hora. Não sei quanto custa a hora de consultoria dele, mas ele estava me dando aquilo de presente. Sou apaixonado por perspectivas de desenvolvimento pessoal, alta performance e existencialismo. Acredite, tem muita coisa por trás de um atleta que atua em alta performance e com certeza eu saí de lá muito melhor do que cheguei.

O lutador de ponta não é apenas um ser musculoso capaz de te destruir em dez segundos, muito pelo contrário, talvez essa seja a última atitude que podemos esperar desses atletas. Existe um trabalho muito sério que está muito além da técnica de luta. Ainda estou digerindo as informações que aprendi no treino e no pós treino. O Daniel me indicou um livro chamado: Descubra seus pontos fortes. Saí da Cerrado MMA e fui direto numa livraria para comprá-lo.

Sinto dores nos pés, o Daniel disse que isso aconteceria, estou indo pra minha segunda sessão de gelo e o sentimento no meu corpo é de gratidão. O universo está sendo muito generoso comigo.

 

Amanhã tenho um trabalho que me impede de ir ao treino, queria que o mundo parasse por um mês para que eu fosse capaz de viver apenas essa oportunidade, mas a vida é assim mesmo, cheia de desafios e adversidades.

Agradeço ao Daniel, Lucas e atletas da equipe Cerrado MMA pela oportunidade.

Luz e amor na caminhada!

Eduardo Sande

Eduardo Sande

Ator, apresentador e pesquisador na área de desenvolvimento pessoal e alta performance.

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